MENEZES, Albino Espiridião de (18/12/1889, Santana – 1949, Funchal). Nasceu no dia 18 de Dezembro da importante família Teles de Menezes, do norte da Ilha da Madeira. Filho único, Albino de Menezes recebeu dos pais uma educação esmerada. O pai, professor primário, ensinou-lhe a escrever. Frequentou o Liceu do Funchal, de 1905 a 1908. Tudo indica que o primeiro artigo publicado seja “Discorrendo”, no jornal A Pátria, em 1906. O estudante liceal iniciava, assim, uma vasta publicação dispersa, de trinta anos, em jornais do continente e da Ilha da Madeira. No ano seguinte a este artigo, o Diário de Notícias, de 1907, divulgou “Carta de Longe”, onde escreveu sobre a insularidade interna da Ilha da Madeira, um assunto muito pouco abordado no seu tempo. Albino de Menezes considerava o Funchal um “centro de progresso” e “Sant’Anna” um “centro de estacionamento”. O afastamento cultural da cidade fazia de Santana, a terra que o vira nascer, uma ilha dentro da própria ilha. Albino de Menezes partiu para Coimbra, em 1909, onde se inscreveu no Curso de Direito, não conseguindo adaptar-se ao ambiente diletante e pretensioso da academia. Estava, também, contra a literatura vigente, cujo modelo era a revista Dionysios (1912), dirigida por Aarão de Lacerda e de João de Lebre e Lima. Entretanto, Albino de Menezes deslocava-se a Lisboa, quer para visitar as exposições dos modernistas, quer para participar em tertúlias literárias. Em 1912, Albino de Menezes emparceirou com Fernando Pessoa, em “Portugal Intelectual. Inquérito Literário”, no Diário da República. Por esta altura, foi-lhe apresentado por Lúcio de Azevedo. Sobre Albino de Menezes, assim registou Fernando Pessoa no seu diário, dessa terça-feira, 9 de Abril de 1913: “Encontrei o Albino de Menezes e vim com ele até ao Largo de Santa Bárbara, falando muito. – Uma ou duas ideias literárias, de segunda ordem.” (Cf. Páginas Íntimas e de Auto-Interpretação, Lisboa, Edições Ática, 1966, p. 60). Concluído o curso de Direito em Coimbra com brilhantismo, em 1915, Albino de Menezes fixou-se em Lisboa e passou a residir em S. João da Pedreira. Neste mesmo ano, voltou a colaborar com Fernando Pessoa na “Crónica da Vida que Passa..”,  de O Jornal.  Costumava reunir-se na Brasileira com o grupo de Orpheu e com alguns conterrâneos ilhéus, entre eles, o poeta João de Gouveia, Edmundo de Bettencourt e Octávio de Marialva.

Em 1916,com o conto “Apoz o Rapto”, Fernando Pessoa integrou Albino de Menezes em Orpheu 3. Dos oito colaboradores da revista literária, Albino de Menezes figurava entre Mário de Sá-Carneiro e Fernando Pessoa, o que poderá indicar que ambos depositavam fortes expectativas na prosa erótica e nostálgica de Albino de Menezes, inspirada em Gabriele D’Annunzio. O conto “Apoz o Rapto” bem poderia ser o meio de chamar a atenção do leitor para esta vertente controversa do modernismo e atrair novos colaboradores com outras propostas literárias para a revista. No que diz respeito ao Sensacionismo, embora o conto de Albino de Menezes contemple afinidades simbolistas, nefelibatas ou decadentes, seguia de muito perto as passadas órficas do duplo e da escrita paúlica. Assim, em “Apoz o Rapto”, através do monólogo lírico simbolista, um “eu”-narrador, personagem de “vinte annos”, dirige-se a um “tu”, a mulher amada, numa visão fruída do “deliroso prazer” da “primeira noite de núpcias”. Nesta jornada do “eu”-narrador para essa outra dimensão, o leitor é induzido a uma relação intertextual com as imagens do fogo, tão em voga no Modernismo. Assim escreve Albino de Menezes no conto “Apoz o Rapto”: “Um incêndio há-de ir lavrando em torno, aluviões de lava em púrpura irão arrasar-te o corpo inteiramente, como se um Deus estranho abrisse vulcões no teu sangue”. De uma forma vaga, essa “outra mulher” que o “adora” é, somente, caracterizada pela expressão “minha bem amada de olhos muito doces”. É, pois, o sonho de alguém que se dilui no outro e que vive o momento presente, no porvir dessa hora “dolentemente milagrosa”. Alguns anos mais tarde, a propósito desta outra dimensão, como se falasse com o seu próprio duplo, Albino de Menezes escreveu o seguinte: “Porque, deves compreender, o que principalmente agita em minha vida o prazer de amar-te além das balisas da visão, jamais te havendo visto, e sem querer ao menos querer menos possuir-te ou te beijar.” (Cf. “Almas Raras”, in Diário da Madeira, 11 de Maio de 1922). Mas, a busca do duplo, em Albino de Menezes, poderá comparar-se, à ambiguidade da figura mitológica da quimera. Desta maneira, embora o “eu”-narrador procure, incessantemente, a “alma rara”, na medida em que ela é a sua própria “encarnação da consciência”, teme o perigo de vir a encontrá-la. À maneira órfica, sabia que ela estava condenada à dispersão ou ao nada.

Culto e distinto, Albino de Menezes destoava de Santana. Nas décadas vinte e trinta, além da jurisdição, dedicava-se à escrita. Na casa da sua vasta quinta, existia uma riquíssima biblioteca. Um dos seus mestres era Fialho de Almeida que o fazia chorar de emoção. Por esta altura, Albino de Menezes publicou, no Diário da Madeira e no Diário de Notícias do Funchal, uma série de aforismos intitulados “Arc-en-Ciel”, “Puzzle”, “Blasfémias” e “A Outra Margem”. Estes depurados fragmentos recorrem à imagem de imagens, processo linguístico que levou Fernando Pessoa a criar o Interseccionismo (“A tristeza é um parasol aberto sobre a vida”). No dia de Natal de 1925, no Diário de Notícias do Funchal, veio a público “Era uma vez, um Natal em pequenino…”. No conto autobiográfico, ao falar da mãe e da sua feliz infância, em Santana, Albino de Menezes revelava-se, novamente, como o escritor da simplicidade da palavra, a exemplo dos aforismos e das quadras. Em Junho de 1927, pela mão de Abel Almada e de Edmundo de Bettencourt, o escritor colaborou na presença 5, com um poema de estrutura poética livre, “Olá, Vadio!”. Numa visão cinematográfica, na tradição de Cesário Verde ou de Álvaro de Campos, o poema debruça-se sobre a realidade cosmopolita de um cais, onde acaba de atracar um “Mauritânia” de “Seis Mastros”... Embora os textos de Albino de Menezes, escritos depois de 1922, continuem a guardar o imaginário modernista dos tempos de Orpheu, em temas como o Natal, a infância, a hora, o cais ou a viagem, apresentam uma linguagem que foge à usual retórica do prosador. Albino de Menezes, o contista e o poeta com uma vasta obra em epistolografia, novela e crónica, deixou de publicar por volta de 1930. Dado o agravamento da doença mental que o vinha afligindo, desde jovem, já não conseguia cumprir com a mesma competência as suas funções profissionais. Santana, “centro de estacionamento”, como havia escrito vinte anos antes, fizera dele um inadaptado entre os seus próprios conterrâneos, que o consideravam um excêntrico. Cada vez mais solitário, deixou-se afundar no álcool. Esteve várias vezes internado na Casa de Saúde do Trapiche, como doente mental, em Santo António, próximo do Funchal. Acabou os seus dias na mais absoluta miséria. Também, à maneira dos seus pares de Orpheu, o escritor faleceu  ignorado, nessa terça-feira, 26 de Abril de 1949. Ficou sepultado no Funchal.

 

BIB.: Martins, Fernando Cabral, O Trabalho das Imagens, Lisboa, Aríon Publicações, 2000; Teixeira, Mónica, Tendências da Literatura na Ilha da Madeira nos Séculos XIX e XX, Funchal, Centro de Estudos de História do Atlântico, (D.R.A.C.), 2005.