De personalidade multifacetada – escritora, editora, pedagoga, publicista, feminista – marcou com a sua intervenção os primeiros tempos da República, atitude que se iria prolongar até à morte. Foi uma lutadora que lutou por ideais. Nascida em 1872 em Mangualde, filha de Mariana Osório de Castro Cabral e Albuquerque e de João Baptista, magistrado, aliava a lustre da ascendência materna à formação cultural paterna. Cresceu, assim, em ambiente privilegiado pelo sangue e pelo mérito, já que o pai, também bibliófilo, “sempre lhe proporcionou o acesso às novas ideias que alastravam pelo mundo e aos poucos criavam raízes em Portugal, permitindo-lhe a leitura dos volumes da sua vasta e variada biblioteca”, como afirmou. Uma das suas biógrafas, Fátima Medeiros. Além disso, colheu os frutos do espírito de abertura que se praticava na vida familiar, marcada pelo debate frontal de ideias e de questões. Abriu-se-lhe, assim, o caminho da escrita, que bem cedo iniciaria, já residente em Setúbal, para onde a família se deslocara. Ali conheceu o poeta e republicano, Francisco Paulino Gomes de Oliveira, idealista e apaixonado, com quem viria a casar e cuja influência não deixaria de se fazer sentir nas suas opções políticas e na sua faceta de mulher combativa e combatente. Eventualmente influenciada por ele e com a anuência desejada, filiou-se em 1907 na maçonaria, onde integrou primeiro a Loja Humanidade e posteriormente uma outra, que ela própria fundou levada pelo ideal feminista, e a que deu o nome de Carolina Beatriz Ângelo (1915), a primeira mulher a votar em Portugal. Escolheu como pseudónimo o nome de Leonor da Fonseca Pimentel, a portuguesa de Nápoles, talvez por sentir afinidades com quem pagou com a vida a fidelidade ao ideal republicano, além de se ter empenhado na defesa da dignidade da mulher e de ter ultrapassado preconceitos tradicionais ao editar o periódico Il Monitore, de nítida intervenção política. Se a filiação na maçonaria correspondeu à convicção do contributo que o associativismo traria à sua causa política, seria idêntico sentir que a levaria a desenvolver num duplo sentido o associativismo feminista. Não teria sido obra do acaso que no mesmo ano marcado pela adesão à maçonaria, tivesse criado o Grupo Português de Estudos Feministas, seguido no ano seguinte da Liga Republicana das Mulheres Portuguesas e, passados anos da Associação de Propaganda Feminista (1911) e que, com o rebentar da Guerra, tivesse criado a Comissão Feminista pela Pátria (1914) e organizado a Cruzada das Mulheres pela Paz, da iniciativa de Elzira Dantas Machado (1915). Deu assim corpo, tanto ao feminismo como ao republicanismo, os dois grandes interesses da sua vida, afinal intrinsecamente conjugados no seu pensamento e acção. Acompanharam-na ambos ao longo da vida, juntos com outros dois com os quais se imbricavam.: a educação e a solidariedade social. A todas consagrou o seu activismo incansável. Tratou a questão da educação em duas vertentes, que correspondiam a dois imperativos. Um feminista – era imperioso educar a mulher para que ocupasse na sociedade o lugar que lhe pertencia. Outro cívico – importava educar as crianças para que se tornassem bons cidadãos. Com o intuito de responder ao primeiro procurou criar em todo o pais escolas profissionais para raparigas além de chamar a atenção pela imprensa para os direitos das mulheres e de lutar por eles de variadas formas. Paradigmática nesta área seria a publicação em 1905 da obra intitulada Às Mulheres Portuguesas à qual se juntou uma enorme produção literária que contou com livros, novelas, artigos na imprensa periódica (ainda hoje não suficientemente estudada), etc. Nestes escritos, Ana de Castro Osório deu especial relevo “ao papel da mulher na sociedade” e a temas ligados à sua situação social, tal como o divórcio -  A Mulher no Casamento e no Divórcio (1911), Ambição (1903), Mundo Novo (1927), à emancipação( Um Passo em Falso), ao problema das mães solteiras -  A Sacrificada (1904), A Verdadeira Mãe (1925). E foi particularmente sensível à função maternal e educativa das mães - As Mães devem Amamentar os seus Filhos (1901)e A Educação da Criança pela Mulher (1905). Dando corpo ao segundo, tornou-se pioneira em Portugal da literatura infantil, vencendo os obstáculos para lhe dar expressão que pretendia. Com este intuito criou à sua custa uma editora, a Casa Editora para as Crianças, posteriormente as Edições Lusitânia, assumindo como tarefa própria a venda e distribuição de contos e histórias destinadas e educar e distrair os mais novos. Em 1897 deu início a publicações que lhe eram destinadas com uma série de contos populares adaptados e outros da sua autoria que intitulou Para as Crianças que encerraria em 1935 depois de publicados 18 volumes. Lembremos, entre muitos outros, Bem prega Frei Tomás (1905)e Os Dez Anõezinhos da Tia Verde Água, além das traduções de Grimmm e Andersen. Enveredando pelo caminho da educação cívica decorrente dos seu ideário republicano, escreveu obras adoptadas posteriormente como manuais escolares em Portugal e no Brasil e, por vezes distribuídos como prémios. Exemplos a não esquecer são A minha Pátria (1906), Uma Lição de História (1909), Lendo e Aprendendo (1913), Viagens Aventurosas de Felícia e Felizardo no Brasil (1923). Seguindo os passos da sua patrona na maçonaria, Ana de Castro Osório manifestou especial predilecção pela imprensa periódica e pelo papel que ela podia desempenhar na divulgação das ideias e ideais que a propaganda republicana veiculava. Com este objectivo, fundou, ainda em Setúbal, a revista feminina intitulada A Sociedade Futura, seguindo-se-lhe a criação ou colaboração em muitas outras, entre as quais se salientam Alma Feminina, Ave Azul, O Jornal dos Pequeninos, A Montanha – Para as Crianças; Nova Aurora, A Semeadora, A Mulher Portuguesa, A Mulher e a Criança, etc., etc. Publicou a primeira crónica em a Mala da Europa (1895) e desejou, sem o alcançar, ser colaboradora remunerada de um grande jornal diário. Cultivou uma amizade especial por Camilo Pessanha, sem que tenham sido aprofundados até hoje eventuais indícios de influência recíproca de cânones literários.

Bib. João Esteves, “Ana de Castro Osório”, Dicionário no Feminino, t. 1, dir. Zília Osório de Castro e João Esteves, Lisboa, Livros Horizonte, 2005, pp. 91-95; Maria de Fátima da Câmara Ribeiro de Medeiros, Do fruto à raiz. Uma introdução às histórias maravilhosas da tradição popular portuguesa. Recolhidas e recontadas por Ana de Castro Osório. Dissertação de Mestrado em Literatura Comparada Portuguesa e Francesa. Séculos XIX e XX. Lisboa, 1997. Dicionário de Literatura, dir. de Jacinto Prado Coelho, Porto, Figueirinhas, 1984.

                                      Zília Osório de Castro