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Fundo
Fernando Pessoa
Cota
BNP-E3, 19 - 24
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[Sobre arte]
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Autor
Fernando Pessoa

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Titulo
[Sobre arte]
Titulos atríbuidos
Edição / Descrição geral

[19 – 24]

 

All art is the result of a collaboration between feeling and thought; not only in the sense that reason works, in building the work of art, upon elements which feeling supplies, but also, and it is this that now concerns us, in the sense that the very feeling upon which reason thus works, and which is the matter on which reason puts form, is a special kind of feeling – a feeling in[1] which thought collaborates.

Now thought may collaborate with feeling in three ways. It may be the basis of that feeling; it may interpret that feeling; and it may mix directly with that feeling, so as to intensify it by complexity. The first manner of feeling is that of classical art, the second that of the romanticists, the third that which is peculiar to those artists, who have been described as decadent.

The true classical artist – leaving, as it does not concern us, the discipline and constructive reason he employs, for this is a formal and not a material element – thinks his poem first, and then feels on the basis of that thought. We can find quite near to our times some excellent examples of this: as Alfred de Vigny’s “Moise”, which is patently an idea worked out through emotion; as Arnold’s “Scholar Gipsy”, as Francis Thompson’s “The Hound of Heaven” (so little classical in anything else except its basis); as Wordsworth’s great Ode. It is not necessary to add that all great art is classical, even lyrically; for no art is great if it do not touch our mind at all points, both in feeling and in reason. This no poem does as the classical poem, thus composed. While, in its development it wakes our feeling, it wakes it only that such feeling may give life to the immanent idea which, when the poem is fully read, completely emerges. No great lyrical poem was ever composed except on this reasoned or instinctive scheme.

The real decadent art is that of the romantics. Here the point of departure is feeling; intellect is used to interpret that feeling. Romanticism is nothing else. Hence the intolerable waste stretches of Hugo, where one trite or feeble feeling is drawn out by a subsidiary application of intellect, till the reader is tired; for the underlying sentiment cannot, being trite and vulgar, bear so lengthy a development, and the subsidiary thought (besides its lie to human nature, for intellect, though later in evolution is primary in all the higher life) can do no more than turn round and round the central emptiness of real inspiration. Take, for an instance, Hugo’s “Ce que dit la bouche d’ombre”: this poem should be about one fifth of its real length, for the central feeling does not admit the rational development, and, as the feeling cannot admit it and yet the rational development is nevertheless made, the result is that most of that rational element is out of touch and {…}

 

The system of mixing thought and feeling, though peculiar to decadents, is only really decadent when intellect is used to interpret the interpenetrated feeling; when it is used (as at first seems most decadent) to stimulate that feeling, it is used exactly as in the classicists, save that the artist’s intention is not to {…}

 

 

[19 – 24]

 

Toda a arte é o resultado de uma colaboração entre o sentimento e o pensamento; não só no sentido em que a razão trabalha, ao construir a obra de arte, sobre elementos que o sentimento fornece, mas também, e é isto que agora nos interessa, no sentido em que o próprio sentimento sobre o qual a razão trabalha, e que é a matéria à qual a razão imprime forma, é um tipo especial de sentimento – um sentimento no qual o pensamento colabora.

Ora o pensamento pode colaborar com o sentimento de três formas. Pode ser a base desse sentimento; pode interpretar esse sentimento; e pode misturar-se directamente com esse sentimento, de modo a intensificá-lo pela complexidade. A primeira forma do sentimento é a da arte clássica, a segunda a dos românticos, a terceira a que é peculiar àqueles artistas que têm vindo a ser descritos como decadentes.

O verdadeiro artista clássico – deixando de parte, uma vez que isto não nos diz respeito, a disciplina e razão construtiva que emprega, pois isto é um elemento formal e não material – pensa primeiro o seu poema e depois sente com base nesse pensamento. Podemos encontrar, bem próximo da nossa época, alguns excelentes exemplos disto: como “Moise” de Alfred de Vigny, que é patentemente uma ideia trabalhada através da emoção; como “Scholar Gipsy” de Arnold, como “The Hound of Heaven” de Francis Thompson (tão pouco clássico em tudo excepto na sua base); como a grande Ode de Wordsworth. Não é necessário acrescentar que toda a grande arte é clássica, mesmo liricamente; pois nenhuma arte é grande se não tocar a nossa mente em todos os pontos, tanto no sentimento como na razão. Não existe poema que consiga isto como o poema clássico, assim composto. Enquanto no seu desenvolvimento ele desperta o nosso sentimento, desperta-o apenas para que esse sentimento possa dar vida à ideia imanente que, quando o poema for inteiramente lido, emerja completamente. Nenhum grande poema lírico foi jamais composto a não ser neste esquema raciocinado ou instintivo.

A arte realmente decadente é a dos românticos. Aqui o ponto de partida é o sentimento; o intelecto é usado para interpretar esse sentimento. O romantismo não é outra coisa. Daí os intoleráveis trechos de resíduos de Hugo, onde um sentimento banal ou fraco é prolongado por uma aplicação subsidiária do intelecto, até cansar o leitor; pois o sentimento subjacente não pode, sendo banal e vulgar, suportar um desenvolvimento tão longo e o pensamento subsidiário (para além da sua mentira em relação à natureza humana, pois o intelecto embora posterior na evolução é primário em toda a vida superior) não pode fazer mais do que andar repetidamente à volta do vácuo central da inspiração real. Considere-se, por exemplo, “Ce que dit la bouche d’ombre” de Hugo: este poema deveria ter cerca de um quinto da sua extensão real, pois o sentimento central não admite o desenvolvimento racional e, uma vez que o sentimento não o pode admitir e contudo o desenvolvimento racional é ainda assim efectuado, o resultado é que a maior parte desse elemento racional está fora de alcance e {…}

 

O sistema da mistura de pensamento e sentimento, embora peculiar aos decadentes, é apenas realmente decadente quando o intelecto é usado para interpretar o sentimento interpenetrado; quando é usado (como a princípio parece mais decadente) para estimular esse sentimento, é usado exactamente como nos classicistas, exceptuando que a intensão do artista não é {…}

 

 

[1] in /with\

Notas de edição
Identificador
https://modernismo.pt/index.php/arquivo-almada-negreiros/details/33/2468

Classificação

Categoria
Literatura
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Dados Físicos

Descrição Material
Dimensões
Legendas

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Idioma
Português

Dados de conservação

Local de conservação
Biblioteca Nacional de Portugal
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Documentação Associada

Bibliografia
Publicações
Fernando Pessoa, Páginas de Estética e de Teoria e Crítica Literárias, Textos estabelecidos e prefaciados por Georg Rudolf Lind e Jacinto do Prado Coelho, Lisboa, Edições Ática, 1966, pp. 151-152.
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