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Fernando Pessoa
Cota
BNP/E3, 14-4 – 10
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[Sobre o teatro estático]
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Autor
Fernando Pessoa

Identificação

Titulo
[Sobre o teatro estático]
Titulos atríbuidos
Edição / Descrição geral

[BNP/E3, 144 – 10]

 

  1. Chama-se Teatro[1] à forma totalmente sintética da arte literária. Porque essa forma é totalmente sintética suprime todos os elementos acessórios e de algum modo dispensáveis na literatura. Por isso reduz a presentação literária ao mínimo – isto é, à personagem ou personagens, e, no caso de serem personagens, à sua interacção, visto que não é de crer que existam, que sejam mais do que uma, para, de qualquer modo que seja, não agirem umas sobre outras.
  2. O Teatro[2] tem 3 formas possíveis – a dinâmica, a estática, e a que é uma síntese destas duas. 3. Chamo dinâmica à forma dramática cujo fim é essencial é apresentar uma acção e os caracteres das personagens apenas no que reveladas por essa acção e existentes para essa acção. O teatro usual, de qualquer espécie que seja, o teatro representável, é todo dinâmico. Pode ser como em França tanto de situações, importando os caracteres minimamente e apenas na sua superfície. Pode ser[3], como na alta comédia propriamente tal, tudo ligado à interacção dos, definidos, psiquismos sendo as situações resultantes da coexistência desses psiquismos. E pode ser como as peças em geral são ou pretendem ser, uma combinação destas duas coisas, isto é, determinados caracteres que uma determinada acção (não essencialmente produzida por esses caracteres e a sua aparição), faz entrechocarem-se ou produzirem conflitos.
  3. Chamo teatro[4] estático àquele que, longe de buscar apresentar a acção, pretende apresentar inércias, isto é, que pretende revelar as almas naquilo que elas contêm que não produz acção, nem se revela através da acção, mas fica dentro delas, tudo quanto, no bom teatro dinâmico, nunca pode aparecer no diálogo. O que seria mais normal que a poesia[5] lírica desse, ou, quando muito a poesia narrativa no que parte da lírica – forma isso a base do drama[6] estático.

No teatro dinâmico as almas apresentam a sua forma social; no teatro estático deverão apresentar a sua forma impenetravelmente individual. O teatro estático usa o movimento inexprimível, o vitalmente intraduzível.

Daí o dever ser o teatro estático absolutamente irreal e falso. É teatro porque, como acima eu disse, teatro é a forma totalmente sintética da literatura.

 

[10v]

 

A peça que ora apresentamos, pertence a esse género é a primeira de, pelo menos, uma hepatologia de estase[7]. Gira sobre a intervenção, dentro das almas, de três sentimentos – o tédio, a dúvida e o sonho – que são, por sua natureza, incapazes de produzir nem acção, nem sequer desejo de acção. E estes 3 elementos não são excentricidades das almas de caracteres, mas incidem na própria manifestação da existência delas.

O Marinheiro é a 1º peça de essa, pelo menos, hepatologia de estase.

_______

  1. Síntese destas duas formas do drama é aquela terceira forma que, sendo ostensivamente dinâmica, traz porém para o diálogo e talvez para a acção elementos das almas que não {…}

 

O teatro de Shakespeare é estático-dinâmico. O exemplo maior deste teatro é o Hamlet.

Todo o teatro em verso deve ser estático-dinâmico. O facto de ser em verso, que desde logo o afasta da realidade, só deve ser imitado pelo desejo de fazer teatro estático-dinâmico, isto é, de levar até à acção parte das almas que no teatro puramente dinâmico só podem revelar-se com prejuízo da integridade artística e constante do drama.

 

 

[1] Teatro /Drama\

[2] Teatro /Drama\

[3] ser /estar\

[4] teatro /Drama\

[5] poesia /literatura\

[6] drama /teatro\

[7] estase /estática\

Notas de edição
Identificador
https://modernismo.pt/index.php/arquivo-almada-negreiros/details/33/4584

Classificação

Categoria
Literatura
Subcategoria

Dados Físicos

Descrição Material
Dimensões
Legendas

Dados de produção

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Idioma
Português

Dados de conservação

Local de conservação
Biblioteca Nacional de Portugal
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Documentação Associada

Bibliografia
Publicações
Fernando Pessoa, Teatro Estático, Edição de Filipa de Freitas e Patricio Ferrari, Lisboa, Tinta-da-China, 2017, pp. 276-278.
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