Nos últimos anos do século XIX e ao longo da primeira década do século XX, ainda antes das primeiras produções artísticas do Modernismo, a arte e a indústria cinema­to­gráficas seguiram em Portugal o percurso observável na Europa e nos Estados Unidos, tendo-se chegado a verificar algum pioneirismo no plano da realiza­ção. Desde 1895, ano de apresentação em Paris do cinematógrafo dos irmãos Lumière, várias persona­lida­des da vida portuguesa se deixaram seduzir rapidamente pela novidade, um interesse que se traduziria na imediata exibição, a 12 de Novembro de 1896, da película Saída do Pessoal Operário da Fábrica Confiança,de Aurélio da Paz dos Reis, na que foi a primeira sessão do KinetógrafoPortuguês sediado no Porto. Os fil­mes de Paz dos Reis co­locaram Portugal na linha da frente da reali­za­ção e da produção cinematográficas, antes mesmo que tal experiên­cia fosse levada a cabo em países como Espanha, Itália, Rús­sia, Suécia ou Noruega. A partir de então, e na sequência dos inventos dos Lumière e de Edison, sucederam-se, sobretudo no Porto, as sessões públicas de anima­tógrafos, cine­tógrafos, projec­tos­­có­pios, audiógrafos e visiógrafos, fortalecidas ainda pela funda­ção, em 1899, da primeira empresa produtora e distribuidora de filmes, a Portugal-Film. Es­tava montado o sistema que propiciaria, ao longo da primeira década do século XX, a pro­­jecção regular de filmes estrangeiros, bem como o desenvol­vi­men­to da realização ci­ne­­­ma­­tográfica por artistas portugueses, com destaque para as primeiras obras fic­ci­o­nais, O Rapto de Uma Actriz, de Lino Ferreira (1907) e Os Crimes de Diogo Alves, de João Tavares (1911). O que se fez em maté­ria de cinema entre 1896 e 1912 não foi contudo muito além do que já havia sido cumprido por Paz dos Reis.

É a partir de 1912 — ano de estreia de Fernando Pessoa nas páginas d’A Águia, sob a direc­ção de Teixeira de Pascoaes,e do encontro com os futuros com­pa­nheiros do Or­pheu —, que o panorama do cinema em Portu­gal sofre uma evolução fla­gran­te, que se traduzirá numa progressiva conversão da indústria em arte, e num gra­dual questio­na­mento, por parte dos artistas e intelectuais da época, dos princípios, li­mi­tes e funda­men­tos da nova invenção. Nesse ano, o número 2 — dos três que se conhecem — da primeira revis­ta portuguesa de cinema, Cine-Revista, edita­da no Porto, já registava, a propósito do seu primeiro número com tiragem de 7500 exem­­plares, que os milhares destinados à Invicta se haviam esgotado rapidamente, «menos certamente pelos nenhuns méritos de quem o realizou, do que pelo interesse, sempre e sempre crescente, absor­vente, irresistível, que a Cinematografia vem desper­tan­do em Portugal». A Cine-Revista — juntamente com a sua homónima, editada entre 1917 e 1924 — foi apenas o início de uma vertigem edito­rial asso­ciada à sétima arte que, nos decénios seguintes, seria respon­sável pela proliferação de publicações periódicas similares e cada vez mais elaboradas, cujos produtos mais depurados viriam a lume já entre as décadas de 20 e 30, merecendo especial destaque Ar Livre, dirigida por Chianca de Garcia e ilustrada por Bernardo Marques; Cine, com colaboração de António Ferro; Cinelândia, onde escreveram Olavo d’Eça Leal e Mário Saa; Kino, fundada e dirigida por António Lopes Ribeiro — que em 1927 já assinava, com o pseudónimo Retardador, uma página do Diário de Lisboa dedicada exclusivamente ao cinema, Arte Cinematográfica / O Claro-Escuro Animado — e com colaboração de Carlos Queirós, José Gomes Ferreira, Olavo d’Eça Leal, Bernardo Marques e Cottinelli Telmo; Girasol, contando também com a colaboração de Olavo d’Eça Leal, Lopes Ribeiro, Gomes Ferreira, António Ferro e Carlos Queirós (sob o pseudó­ni­mo Rui Casanova); a revista Imagem que, dirigida por Chianca de Garcia e com a redacção a cargo de Gomes Ferreira, editaria, entre 1930 e 1935, 124 números; Anima­tógrafo, também com direcção de A. Lopes Ribeiro, cujos 14 números editados em 1933 contaram com textos de Adolfo Casais Monteiro; e, por fim, a importantíssima Movimento, activa nos anos de 1933 e 1934, graças à participação empenhada de José Régio, Casais Monteiro e Alberto de Serpa, entre outros. A multi­plicação das revistas de cinema a partir de 1912 seguiu pari passu o alargamento da cinefilia em Portugal, paten­te nos planos da realização, da produção, da distribuição, do consumo, da crítica e da censura, com expressão visível no estabelecimento, em 1924, no Porto, da primeira colec­tividade ci­néfila, a Associação dos Amigos do Cinema, anúncio do futuro movi­­­men­to cineclubista.

Entre os anos de 1912 e 1935, à semelhança do que aconteceu no panorama inter­na­cio­nal, o cinema português deu à luz muitos dos seus filmes mais mar­cantes, tor­nando conhecidos aqueles que, ainda hoje, são considerados os seus mel­hores realiza­do­res, a par de alguns dos actores mais célebres da cine­ma­­­tografia portuguesa. Neste contexto e res­peitando a cronologia, merecem realce a curta-metra­gem O Quim e o Manecas (1916), adaptação realizada por Ernesto de Albuquerque e pelo dese­nha­dor, cartoonista, fotó­grafo, actor, decorador, cenógrafo, figurinista e desig­ner grá­fi­co Stuart Carvalhais; as várias obras da decisiva filmografia de Leitão de Barros, desde a comédia inau­gu­ral Mal­­­mequer (1918), até ao primeiro filme sonoro português, A Severa (1931) — realizado em Portugal e em França, com a cooperação de René Clair —, pas­sando pelo importante documentário Nazaré, Praia de Pesca­dores (1929) e pelo seu correlato fic­cional Maria do Mar (1930); as adaptações cinematográficas de romances da Lite­ra­tu­ra Portuguesa levadas a cabo pelo francês George Pallu — com a produção a cargo da então importantíssima Invicta Film, que Pallu dirigia com o italiano Rino Lupo —, cujo maior êxito foi, sem sombra de dúvida, Os Fidalgos da Casa Mourisca (1920); Mu­lheres da Beira (1921), do mesmo Rino Lupo, a partir do conto A Frecha de Misarela de Abel Botelho; Sereia de Pedra, de Roger Li­on (1922) — filme perdido e o primeiro pro­duzido pela Fortuna Film, empresa fundada pela escritora Virgínia de Castro e Almeida, autora do romance que deu origem ao filme de Lion Obra do Demónio; As Pu­pi­las do Senhor Reitor (1922), de Maurice Mariaud, para a Caldevilla Film, entre­tan­to cria­da por Raul Caldevilla; O Pesadelo de António Maria, ilustrado e realizado por Joaquim Guerreiro em 1923, e referenciado como o primeiro filme português de animação, a que se seguiriam os perdidos Uma Viagem à Lua, deFred Netto (1929) e Uma História de Camelos de João Rodrigues Alves (1930), com corolário em Lenda de Miragaia, da autoria de Raul Faria da Fonseca e António Cunhal (1931); A Dança dos Paroxismos (1929), de Jorge Brum do Canto, curta-me­tra­gem vanguardista de divul­gação privada; Ver e Amar (1930), de Chianca de Garcia; o documentário Douro, Faina Fluvial, do atleta e actor Manoel de Oliveira, apre­sentado no V Con­gres­so Internacional da Crí­tica graças à acuidade de António Lopes Ribeiro que, encarre­gado por António Ferro de organizar um espec­tá­cu­­lo de cine­ma por­tuguês para os parti­ci­­pan­tes do evento, viu uma parte do filme no labo­ra­­tório e ficou arre­batado; A Canção de Lisboa (1933), do arquitecto e cenografista Cottinelli Telmo (apoiado por Chianca de Garcia), primeiro fil­me sonoro português inteira­mente pro­du­zido no País, protagonizado por Beatriz Costa, António Silva, Vasco Santa­na e pelo galã Manoel de Oliveira, com colaboração do pintor Carlos Botelho na realiza­ção, de José Gomes Ferreira na montagem e de Almada Negreiros na concepção do genérico e dos cartazes promocionais: o filme inaugurou um novo vector no cinema portu­guês, o da comédia musical que nos vin­dou­ros anos 40 viria a ter tanto sucesso em obras como O Pai Tirano (1941), O Pátio das Cantigas (1941) e O Costa do Castelo (1943); e, por fim, Gado Bravo (1934), de António Lo­pes Ribeiro, enriquecido com versos de António Botto.

A disseminação de produtoras, realizadores, filmes e salas de cinema, o rápido aperfeiçoamento da arte e o inegável impacto junto de um público muito alargado e heterogéneo não tar­da­­ram a ter repercussões institucionais, caracterizadas em grande parte por atitudes sumárias de des­con­fiança. A nível internacional, sublinhe-se que, logo em 1912, um decreto ecle­siás­tico condenava as projecções de filmes em igrejas — prática corrente quando as salas de cinema ainda escasseavam —, e que, em 1913, o Papa Pio X proibia a aparição de qualquer temática religiosa em filmes, uma interdição que, no entanto, parece não ter surtido qualquer efeito prático. A censura por parte da Igreja Católica inaugurada por Pio X viria a conhecer, nos anos subsequentes, uma insistência ainda mais formal, com a promulgação por Pio XI, a 31 de Dezembro de 1929, da Encíclica Divini Illius Magistri, dedicada à educação cristã da juventude, e, em 1930, da Encíclica Casti Connubii, consagrada ao casamento cristão, mas, sobretudo, com a publicação, em 1936, da Encíclica Vigilanti Cura, integralmente dedicada ao ci­ne­ma, cujos preceitos morais se manteriam vigentes até ao Concílio Vati­ca­no II, com base no princípio explicitado de que é «geralmente para o mal que o cinema exerce sua influ­ên­cia». Em Portugal, a censura religiosa rapidamente se articularia com a censura política, que se fez sentir ainda antes da implantação do Estado Novo, pois já em 1917 o Go­ver­no fazia publicar um Decreto onde determinava que «nenhuma fita cinema­to­grá­fica […] que contenha assuntos militares ou directa ou indirectamente faça alusão aos exér­citos be­lige­rantes ou à Grande Guerra, poderá ser exibida nos territórios da Re­pú­blica sem pre­­via­mente ser sujeita à censura militar». A reacção religiosa e política ao cine­ma foi um rigoroso termómetro da forte aceitação popular que a nova arte conheceu logo nos seus primeiros anos. Naturalmente, a comunidade intelectual e artística não se manteve indiferente à novidade, embora, no caso português, tenha sido flagrante o carácter progressivo da adesão ao cinema por parte dos escritores mais importantes da época. Note-se que é radicalmente distinto o entusiasmo e o interesse demonstrado pelos escritores da presença do fraco entusiasmo e débil interesse que, no caso do Orpheu, revelaram os seus mais importantes colaboradores.

Fernando Pessoa nunca se interessou pelo cinema. Com excepção de alguns rarís­simos versos de Álvaro de Campos, como «A cinematografia das horas representadas», «Eu o abstracto, eu o projectado no écran», ou «Rua pelo meu monóculo em círculos de cine­ma­tógrafo pequeno» (Poesias, Lisboa, Ática, 1980, pp. 22, 113, 238), a par das passagens de Bernardo Soares «o sonho tem grandes cine­mas» e «Se eu fosse actor prolongado de cinema» (O Livro do Desassossego, Lisboa, Assírio & Alvim, 1998, pp. 136, 313), é quase impossível encontrar qual­­quer marca da arte no seu discurso, uma indiferença que se acentua sempre que Pessoa inventaria em sequência as várias artes que conhece, ignorando sistema­tica­men­te o cinema, quando até o circo e a decoração chegam a entrar no inventário. A sobranceria é, aliás, devidamente revelada numa carta a José Régio datada de 5 de Maio de 1929 onde, perante um pedido do presencista para responder a um inquérito sobre cinema, Pessoa declara, sem meias medidas: «Ao inquérito sobre cinema não responderei. Não sei o que penso do cinema» (Corres­pon­dência 1923-1935, ed. Manuela Parreira da Silva, Lisboa, Assírio & Alvim, 1999, p. 151). Nos tempos de Orpheu, e sem qualquer incidência na revista, onde a falta do cinema é absoluta, os únicos colaboradores que viriam a expressar sério interesse pela sétima arte foram o editor da revista, António Ferro, e José de Almada Negreiros. Ferro desem­penhou um papel pioneiro no contexto cultural da época ao apresentar no Salão Olym­pia, em Julho de 1917, uma conferência intitulada As Grandes Trágicas do Silêncio, que a Cine-Revista publicaria a partir do seu número 4, na que seria apenas uma das muitas colaborações do escritor para as publicações mais importantes da espe­cia­lidade. Catorze anos mais tarde, o futuro líder do Secretariado de Propaganda Nacional — no seio do qual criaria, em 1935, o Cinema Ambulante — daria à estampa o livro Hollywood, Capital das Imagens, fruto da sua viagem à costa leste dos Estados Unidos. Para Ferro, o cinema apresentava-se como o «teatro do futuro», expressão-sín­te­se do debate mais aceso da época, que questionava o cinema enquanto ameaça à sobre­vivência do teatro, em textos como o homónimo Teatro Futuro, de Augusto de Lacerda (1924), Ideias de Outros, de Eduardo Scarlatti (1927), ou De Regresso a Hollywood..., de Fidelino de Figuei­re­do (1931). De princípio alheio a este debate, Almada Negreiros — cuja intervenção no mundo cinematográfico foi efectiva, graças à concepção de alguns cartazes publicitários que ainda hoje são o rosto de filmes como A Canção de Lisboa, e graças também à sua participação, em 1921, na qualidade de actor, na película O Condenado, de Mário Huguin e Stuart Carvalhais — deu início à sua escrita cinematográfica com uma crónica dedicada a Charlie Chaplin, no Diário de Lisboa de 11 de Maio de 1921, mas acabaria por se render à discussão já em 1935, pro­fe­rindo na Emissora Nacional a palestra «O Cinema é uma coisa, o Teatro é outra», pos­teriormente divulgada no segundo número da revista Sudoeste, em Outubro do mesmo ano, onde tam­bém apresentava o texto «Encora­ja­mento à juventude portuguesa para o cinema e para o teatro». Em ambos os artigos, o ar­tista acusava o aprofun­da­mento da reflexão estética sobre o tema — que os seus contos e novelas já denun­cia­vam, em particular A Engomadeira —, notória em afir­ma­ções como «o cinema […] veio estabelecer a diferença entre a imagem em mo­vi­mento e a imagem parada» ou «hoje quem não tenha verdadeira paixão pelo cinema não poderá nun­ca vir a ser enten­dedor de Arte» (Obras Completas, vol. V, Lisboa, IN-CM, 1988, pp. 122, 124), para o qual haviam já contri­buí­do nos anos anteriores de forma de­ci­si­va os escritores da presença.

Ao contrário do Orpheu, a presença dedicou muitas páginas da revista à crítica de cinema, desde o primeiro número, em 1927, onde figurava a primeira de várias Legen­das Cine­matográficas, consagrada a Buster Keaton e assinada por José Régio, que atribuía a actores como Keaton e Chaplin a responsabilidade da inde­pen­dên­cia do cinema face ao teatro, uma constatação que estaria subjacente aos muitos artigos que o escritor dedicou ao cinema português e internacional da época — «o teatro não morre pela simples razão de que o cine­ma o não subs­titui», dirá (presença, 29) —, dentre os quais é imperativo salientar a recepção crítica à estreia na rea­lização de Manoel de Oliveira com Douro, Faina Fluvial. Régio recenseou a estreia do docu­men­tário na sua versão muda, em 1931 (com A Severa, de Leitão de Barros), bem como na sua versão sonora, com partitura de Luís de Freitas Branco, em 1934 (com Gado Bravo, de Lopes Ribeiro), com uma agudeza estética contrária à impressionista reacção popular de então — que se orientava, numa postura academicista, pela tradição neo-romântica e provincialista do cinema português da época —, mas que a história e pensadores como Pirandello e Unamuno não tardariam a legitimar, mani­festa na segurança da apreciação futurista de que se tratava do «nosso melhor filme», de que «Manuel [sic] de Oliveira con­se­guiu qual­quer coisa de absoluta­mente novo em Port­u­gal»: em suma, de que a grande novida­de do Douro consistia em «ser uma obra de arte» (presença, 33; presença, 43). Assim se iniciava uma prolongada cola­boração inter-artística entre Régio e Oliveira que viria a ter como frutos os filmes Benilde ou a Virgem Mãe, Mon Cas e O Quinto Império, e o documentário As Pinturas do Meu Irmão Julio. As cogitações de Régio sobre Douro, Faina Fluvial assinalam o mo­mento em que a presença começa a re­conhecer a figura do realizador como a do ver­dadeiro criador cinema­tográfico, em de­trimento do actor, avanço substan­cial­mente reforçado pelo pensamento de Casais Mon­teiro, autor de algumas das meditações cinemáticas mais agudas e actuais que se podem encontrar na década de 30 em Portugal. No nº 21 da Movimento, Casais Mon­teiro daria também conta do impacto do filme de Oliveira, num ensaio cujo título resu­me por completo a sua perspicácia: «Douro, Faina Fluvial ¾ Filme de Vanguar­da». O escritor declarava sem reservas que Douro, Faina Fluvial era «o documentário que inau­gu­ra em Portugal uma época nova», para destacar, a partir de argu­mentos colhidos no conví­vio com as teorias de Eisenstein, a excepcionalidade da reali­zação ao nível da mon­ta­­gem «por relações, por sínteses, por associações e evo­cações». a que expres­sivamente chamará «arquitectura de imagens» num ensaio de 1935 (presença, 45).

Nos anos críticos do florescimento do cinema português, da transição do cinema mudo para o sonoro, e do aprofundamento, no plano internacional, das reflexões teóricas sobre a dimen­são estética da arte, a presença desempenhou um papel crucial na divul­gação e crítica dos filmes mais importantes da época — em particular no que respeita à recepção do cinema cómico mudo, do cinema soviético e do cinema expres­sionista alemão —, bem como no despoletar de um pensamento estético substancial, a cargo de Régio e de Casais, mas também de José Gomes Ferreira, envolvido profissio­nalmente no meio cinema­to­grá­fico, alinhando o discurso intelec­tual português ao lado das doutrinas deter­mi­nantes de pensa­dores incontornáveis da estir­pe de Boris Eikhen­baum, Iouri Tynianov, Abel Gance, Béla Balázs, Louis Delluc ou Jean Epstein. É de notar que quase todos os cola­bo­radores da revista, dentro da presença ou em publica­ções afins, dedicaram parte da sua actividade crítica e criadora ao cinema, desde João Gaspar Simões a Alexandre de Aragão ou Afonso Duarte, Mário Saa, Alberto de Serpa ou Rodrigues de Freitas, passando por Olavo d’Eça Leal e Carlos Queirós que, ao lado de Gomes Ferreira e suas personae — cujos ensaios se encontram actualmente reunidos no volume Uma Sessão por Página —, dominariam as páginas da Imagem, colaborando em quase todos os números da revista. O poeta António Botto prestaria tributo em várias das suas canções às actrizes do momento (Lillian Harvey, Greta Garbo, Jean Harlow e Nita Brandão), assinalando deste modo presença assídua nas páginas da Ani­ma­tó­grafo, seria convidado por Marcel l’Herbier para protagonizar o filme O Retra­to de Dorian Gray, e publicaria ainda uma «Canção sobre o Gado Bravo», numa homenagem à película de A. Lopes Ribeiro para que havia composto versos. No ano da morte de Fernando Pessoa e um ano antes de o Papa Pio XI promulgar a Encíclica que fazia entrar em vigor prescrições de natureza moral, o cinema português encontrava-se assim plena­mente conso­lidado, em todos os planos do circuito da comunicação estética: realização, pro­du­ção, público, recepção crítica e meditação teórica.

 

 

BIBLIOGRAFIA

 

PINA, Luís de, História do Cinema Português, Lisboa, Publicações Europa-América, 1986.

PESSOA, Fernando, Argumentos para Filmes, ed. Patricio Ferrari e Claudia J. Fischer, Lisboa, Ática, 2011.

 

Joana Matos Frias