(1904 – 1975)

José Carlos de Araújo Marinho nasceu em 1904, Porto, e faleceu em 1975, Lisboa. Foi um dos primeiros a frequentar a Faculdade de Letras do Porto, dirigida por Leonardo Coimbra, licenciando-se em Filologia Românica, no ano de 1925, com uma dissertação sobre Teixeira de Pascoaes, Ensaio sobre Teixeira de Pascoaes, decerto o primeiro trabalho académico sobre o saudosismo do autor de Regresso ao Paraíso. A proximidade espiritual com Leonardo Coimbra, seu professor, a quem dedicaria em 1945 a sua estreia em livro, levou-o por esta época a participar activamente nas derradeiras actividades da Renascença Portuguesa e a colaborar nas últimas séries da revista A Águia e na revista Princípio. Assinale-se no penúltimo número da primeira (série V, Abril-Maio, 1932) a notável recensão de Marinho ao livro de João Gaspar Simões, O Mistério da Poesia, onde por um lado se encontra uma perspicácia crítica invulgar, deixando antever um dos mais criativos e enigmáticos hermeneutas da escrita portuguesa do século XX, e por outro se percebe a proximidade da geração que saiu da primeira Faculdade de Letras do Porto daquela outra que em Coimbra publicava Presença, de que Marinho foi de resto um dos mais importantes colaboradores.

Proibido de dar aulas no ensino público, por ter recusado solidariedade a Oliveira Salazar depois do atentado que este sofreu em 1937, ganhou a vida numa semi-obscuridade pública como explicador particular e tradutor literário. Publicou apenas, a bem dizer, três livros em vida, O Pensamento Filosófico de Leonardo Coimbra (1945), Teoria do Ser e da Verdade (1961) e Filosofia: Ensino e Iniciação (1972), deixando porém uma vastíssima colaboração da maior importância espalhada por jornais e revistas e ainda um riquíssimo espólio de inéditos que apenas começou a ser trabalhado na última década do século XX por Jorge Croce Rivera. Só hoje, depois de publicados os oito primeiros volumes das suas Obras, num conjunto de muitos milhares de páginas, muitas delas inéditas, estamos em condições de começar a perceber a extraordinária vastidão deste pensamento escrito e as rasgadas e luminosas perspectivas que ele abre em muitos dos mornos terrenos da cultura portuguesa contemporânea.

Como exegeta da poesia portuguesa moderna, Marinho valorizou as poéticas de aspecto metafísico, vendo nelas uma modernidade densa e sólida, e desvaliou as poéticas de feição artística e formal, mais próximas da correcta lírica parnasiana que da inquieta enunciação dramático-narrativa. Neste sentido, o poeta português expressivamente moderno de Marinho não foi Fernando Pessoa, cuja experiência da cisão heteronímica lhe parecia uma brincadeira menor, mas, na linha de Antero e sobretudo de Junqueiro, Teixeira de Pascoaes, cuja percepção unitiva e univocamente ateoteística lhe pareceu a mais plena da literatura portuguesa do século XX. Por aí se aproximou do vislumbre do Cesariny de 1973, que tomou Pascoaes como um poeta bem mais importante que Pessoa.

 

 

Bib: BORGES, Paulo A. E., “Nada, Espírito e Saudade em José Marinho”, in O Pensamento e a Obra de José Marinho e de Álvaro Ribeiro, vol. I [inteiramente dedicado a José Marinho], VV. AA., Lisboa, IN-CM, 2005, pp. 203-219; RIVERA, Jorge Croce, A Mediação do Tempo no Pensamento de José Marinho, Lisboa, Faculdade de Letras (policopiado), 1989; A Doutrina do Nada–O Pensamento Meontológico de José Marinho, Ponta Delgada, Universidade dos Açores (policopiado), 1999.

 

 

António Cândido Franco