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Fernando Pessoa
Cota
BNP/E3, 14E – 81
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[Sobre Shakespeare]
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Autor
Fernando Pessoa

Identificação

Titulo
[Sobre Shakespeare]
Titulos atríbuidos
Edição / Descrição geral

[BNP/E3, 14E – 81]

 

The Shakespeare plays reveal almost everywhere the master’s handling – generally magnificent as to individual strokes of psychological intuition, universally consummate in point of expression and diction – of data from other sources and from other hands. The fusion of data is rarely remarkable for perfection; more often than not the superimposed personality of genius is grafted upon a trunk so unfit for that operation, that we have the result of a parasite act only more beautiful, but larger than the |despoiled| plant.

_______

No care of dramatic consistency ever seems to have preoccupied Shakespeare. Nowhere are his characteristic impatience and artistic[1] levity more painfully evident. He juxtaposes unreconciled elements, grafts new ones on old plants unfit for that operation. Great psychologist as he is by temperament, yet not even a psychologic sample can call him to aesthetic obedience or persuade him into at least one form of dramatic unity.

The whole mind is indisciplined and unadaptable[2], hasty, careless and {…}

 

[81v]

 

He is no Milton.

 

That the Sonnets, by what they say of the author’s {…} for immortality, seem to prove the contrary, shall not deter us; having found, as we have, that we are examining a creature of moods and tumultuary contradictory purposes; who at one time may have had great hopes of building up on immortality by severe art, at the next caring nothing for his lapsed moment’s dream.

He is the greatest sinner of the mighty poets, because he is a sinner against himself, against the possibilities of his genius. No neer-do-well in this world’s material goods and acts ever spoilt more completely the central promise of a “dedicated” life.

It is useless to say that such a temperament is absurd, because such a temperament is his, absurd or not. The world is full of absurd temperaments, of characters with no logic, of great divisions between purpose and act, will and instinct, and of power and its collective use.

 

But such idolatry has paid just this religiosity, it has been so overrun by the tides of † and the floods of fanatism, that it is difficult to see clear and still more difficult to became illusion clearly seen.

 

Such tides[3] of idolatry have swept away all |*images|, such of fanatism covered all land-marks that it became difficult to determine a real realm of the devil and the true relation of things upon it {…}

 

 

[BNP/E3, 14E - 81]

 

As peças de Shakespeare revelam em quase toda a parte o manuseio do mestre - geralmente magnífico quanto a golpes individuais de intuição psicológica, universalmente consumado no ponto de expressão e dicção - de dados de outras fontes e de outras mãos. A fusão de dados raramente é notável pela perfeição; na maioria das vezes, a personalidade sobreposta do génio é enxertada num tronco tão impróprio para aquela operação, que temos como resultado um acto parasita apenas mais belo, porém maior do que a planta |espoliada|.

_______

Nenhum cuidado com a consistência dramática parece ter preocupado Shakespeare. Em nenhum lugar a sua impaciência e leviandade artística são mais dolorosamente evidentes. Ele justapõe elementos irreconciliados, enxerta elementos novos em plantas velhas impróprias para aquela operação. Por ser um grande psicólogo por temperamento, nem mesmo uma amostra psicológica pode chamá-lo à obediência estética ou persuadi-lo a pelo menos uma forma de unidade dramática.

A sua mente é inteiramente indisciplinada e inadaptável, precipitada, descuidada e {…}

 

[81v]

 

Ele não é um Milton. 

 

Que os Sonetos, pelo que dizem do autor {…} para imortalidade, parecem provar o contrário, não nos deve deter; tendo descoberto, como nós, que estamos a examinar uma criatura de temperamentos e tumultuosos propósitos contraditórios; que em um momento pode ter tido grandes esperanças de construir a imortalidade por meio de uma arte severa e no seguinte não se importa com o sonho do seu momento perdido.

Ele é o maior pecador de entre os poetas poderosos, porque é um pecador contra si próprio, contra as possibilidades de seu génio. Nenhum mal-sucedido nos bens materiais e actos deste mundo jamais estragou tão completamente a promessa central de uma vida "dedicada".

É inútil dizer que tal temperamento é absurdo, porque tal temperamento é dele, absurdo ou não. O mundo está cheio de temperamentos absurdos, de personagens sem lógica, de grandes divisões entre propósito e acto, vontade e instinto, e poder e o seu uso colectivo. 

 

Mas essa idolatria pagou justamente o preço dessa religiosidade, foi tão invadida pelas marés de † e pelas inundações de fanatismo, que é difícil ver com clareza e ainda mais difícil tornar-se uma ilusão claramente vista. 

 

Tais marés de idolatria varreram todas as |*imagens|, as do fanatismo cobriram todos os marcos que se tornou difícil determinar um reino real do diabo e a verdadeira relação das coisas sobre ele {…}

 

 

[1] artistic /(aesthetic, constructive)\ 

[2] in/un\disciplined and un/in\adaptable

[3] tides /flows\

Notas de edição
Identificador
https://modernismo.pt/index.php/arquivo-almada-negreiros/details/33/3860

Classificação

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Literatura
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Dados Físicos

Descrição Material
Dimensões
Legendas

Dados de produção

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Idioma
Inglês

Dados de conservação

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Biblioteca Nacional de Portugal
Estado de conservação
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Documentação Associada

Bibliografia
Publicações
Publicação Parcial: Rita Patrício, Episódios - Da Teorização Estética em Fernando Pessoa, Braga, Instituto de Letras e Ciências Humanas da Universidade do Minho, 2008, p. 367 [cf. Rita Patrício, Episódios - Da Teorização Estética em Fernando Pessoa, Vila Nova de Famalicão, Húmus, 2012, pp. 401-402].
Publicação integral: Pauly Ellen Bothe, Apreciações literárias de Fernando Pessoa, Lisboa, Imprensa Nacional-Casa da Moeda, 2013, pp. 244-245; 512.
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