[BNP/E3, 142 – 51]
{…} e convexo da mesma superfície curva. Quando a água passa, em temperatura, de 99 a 100 graus centígrados, converte-se em vapor: mudou de quantidade em temperatura, mudou de qualidade em estado, o fenómeno foi só um. No caso destes dois ideais, notaremos a sua identidade, não só pela de origem, em que já falámos, mas também pelo modo igual como se diferenciam do ideal apolíneo. Aquele é harmónico e natural, estes desarmónicos e místicos. Aquela assenta na aceitação da vida; estes, de um modo e de outro, na comum negação dela.
Não há caso mais notável dessa identidade que o de Nietzsche, de quem são as palavras apolíneo e dionisíaco, de que, com justificação independente, acabámos de fazer uso. Nietzsche tinha-se por dionisíaco, e, infelizmente para ele, o era. Não há mais claro exemplo do misticismo - na exaltação, na incoerência, no abandono de si, na mesma loucura terminal - que o daquele pseudo-pagão. Ele era, até, um místico cristão; simplesmente o era às avessas. O seu ódio aos cristãos o prova: é o ódio turvo, introvertido, de quem se sente igual aos que odeia.
Idênticos na matéria, estes dois ideais são contudo, não só diferentes, mas opostos, na forma: são, repetindo a imagem, como os aspectos opostos, o côncavo e o convexo, da mesma superfície curva. Para o dionisíaco a vida é estreita; para o cristão a vida é vil. Para um é uma {…}