António Correia de Oliveira nasceu em 1879, São Pedro do Sul, e faleceu em 1960, Belinho, Esposende. Estreou-se muito cedo, na segunda metade da última década do século XIX, com uma poesia de travo castiço, a condizer com o imaginário ruralizante e lusocêntrico das Palavras Loucas (1894) de Alberto de Oliveira. Assim como assim, aquilo que identifica o primeiro Correia de Oliveira com o neogarrettismo é só essa valorização do gosto popular, pois as altas motivaçõe do nacionalismo literário da geração de 90, mais próximas todavia de Sampaio Bruno que de Alberto de Oliveira, e que deram depois o cosmopolitismo aberto mas situado de autores como Pascoaes, Cortesão ou Pessoa, para além das implicações criativas que deixaram na obra do último Eça, não encontraram em Correia de Oliveira interpretação genuína que abrisse ao autor nesse domínio caminho original.

O autor, que se aproximou do saudosismo com um poema de porte panteísta, Tentações de Sam Frei Gil (1907), a que é de lei acrescentar Alma Religiosa (1910), participou nos primeiros números da revista A Águia, foi sócio da Renascença Portuguesa e aparece por direito associado à feição saudosista do grupo. Pascoaes valorizou nele a expressão da alma colectiva, chamando-lhe povo-poeta (in A Águia, II S., nº 1, Janeiro, 1912); Fernando Pessoa por sua vez nos artigos sobre a nova poesia portuguesa cita-o no segundo texto do conjunto (in A Águia, nº 5, Maio, 1912), falando da “nova fase de António Correia de Oliveira”, referindo-se decerto aos pressentimentos metafísicos de poemas como Tentações de Sam Frei Gil e Alma Religiosa. De qualquer modo, na única carta que se conhece de Pessoa a Correia de Oliveira, com a data de 11 de Março de 1914, é de etnografia que se fala, pedindo Pessoa bibliografia sobre os provérbios populares portugueses.

Com o aparecimento do Integralismo Lusitano e a publicação a partir de 1914 da revista Nação Portuguesa, de que Correia de Oliveira se tornará assíduo visitante, abandona quase por completo a revista A Águia (uma única colaboração depois de 1913), regressando à sua primitiva condição de vate simples, com forte vocação tradicionalista. Cantou em redondilhas de sabor popular os temas religiosos imediatos, vindos muitas vezes do calendário hagiográfico, e fez uma exaltação sonora e repetida da galeria das figuras pátrias ilustres, tornando-se assim no acarinhado poeta da reacção monárquico-tradicionalista e depois no poeta oficial do regime saído do golpe militar de 1926.

A segunda geração da Renascença Portuguesa, aquela que saiu da primeira Faculdade de Letras do Porto na década de 20, mostrou-se já muito afastada do poeta e um dos seus elementos mais destacados, José Marinho, chegou mesmo a atacar com virulência Correia de Oliveira numa das publicações oficiais da Renascença, a revista Princípio (nº 3, 1930), no texto “Considerações sobre uma Apoteose”, em que, opondo-lhe a universalidade da visão local de Teixeira de Pascoaes, acusa o nacionalismo fechado do poeta de esvaziar a noção de nacionalidade.

Assim como assim, a extensa obra de Correia de Oliveira está ainda hoje à espera de uma releitura distanciada, que possa avaliar de forma aberta e descomprometida o seu real valor.

 

Bib: PONTES, Cruz, “Dizeres do Povo de Corrêa d’Oliveira e uma Carta Inédita de Fernando Pessoa”, in revista Prelo, Lisboa, IN-CM, 1984, pp. 7-18.

 

António Cândido Franco