Athena. Revista de Arte mensal, sai em Lisboa em Outubro de 1924 e chega aos cinco números, com direcção literária de Pessoa e direcção artística de Ruy Vaz. O penúltimo número de Athena sai em Janeiro de 1925, e o último, apesar de datado de Fevereiro, só sai de facto em Junho, o que pode ter a ver com a morte da sua mãe a 17 de Março.  

Esta é a segunda revista de que Pessoa é director, dez anos depois da gloriosa catástrofe de Orpheu. E, se nesta tinha surgido sob o nome de Álvaro de Campos, além do seu próprio, em Athena virá revelar finalmente os nomes de Ricardo Reis e Alberto Caeiro. É por isso que se pode dizer – para além da deliberada proximidade dos títulos – que há uma diferença substancial entre as duas revistas, a primeira de combate e escândalo, a segunda de explanação e construção – antes de tudo, da própria heteronímia como sistema de poetas. Este objectivo é realizado publicando conjuntos relativamente extensos de poemas deles. Assim, Ricardo Reis é revelado no n.º 1 com 20 composições: Odes. Livro Primeiro. Alberto Caeiro publica duas «escolhas de poemas»: 22 poemas de O Guardador de Rebanhos no n.º 4, e 16 dos Poemas Inconjuntos  no n.º 5. O método de apresentação dos heterónimos é igual ao dos autores: não liga editorialmente nenhum dos três heterónimos a Pessoa (como acontece em Orpheu 1, onde ainda aparece o subtítulo «duas composições de Álvaro de Campos publicadas por Fernando Pessoa»), e, no caso de Alberto Caeiro, insere mesmo operadores de verosimilhança, colocando sob o nome do autor as datas de nascimento e morte «(1889-1915)», e, sob cada uma das «escolhas de poemas»  as datas da sua escrita, a primeira «(1911-1912)» e a segunda «(1913-1915)». O caso de Álvaro de Campos é singular, pois as suas publicações são todas em prosa ensaística, e a primeira («O que é a Metafísica?», n.º 2) apresenta-se como uma discussão de certos pontos do editorial que Pessoa colocara na abertura do n.º 1, seguindo-se nos n.ºs 3 e 4 um artigo capital, «Para uma Estética Não-Aristotélica». A singularidade de Álvaro de Campos acentua-se mais pelo facto de Mário Saa resolver entrar no jogo, publicando um artigo em que polemiza com Álvaro de Campos, sendo que nessa intervenção refere por duas vezes que o talento de Álvaro de Campos é «só comparável ao de Fernando Pessoa». Ou seja, na órbita cultural dos modernistas é corrente que Álvaro de Campos é outro nome de Pessoa.

Para além do artigo introdutório do n.º 1, que enaltece o sentido de aperfeiçoamento cultural que está ligado ao nome escolhido para a revista («Não se aprende a ser artista; aprende-se, porém, a saber sê-lo. […] Cada um tem o Apolo que busca, e terá a Atena que buscar»), Pessoa publica uma série de 16 poemas sob o seu próprio nome no n.º 3, e traduções suas de Poe, O. Henry e Walter Pater. Apresenta os Últimos Poemas de Mário de Sá-Carneiro, que fora seu amigo dilecto, tal como inclui Almada Negreiros, António Botto, Raul Leal, Augusto Ferreira Gomes, Luiz de Montalvor, Mário Saa e publica poemas de Henrique Rosa, irmão do padrasto. Como se pode ver, Athena é uma revista talhada à perfeita imagem de Pessoa e do seu íntimo círculo afectivo.

Com uma outra componente importante: a parte dedicada às artes plásticas e arquitectura, dirigida por Ruy Vaz, que inclui artigos e várias páginas de reproduções, e em que surgem com muito relevo Almada Negreiros e Milly Possoz, para além de outros artigos e reproduções em que o clima quase académico da revista por vezes assoma.

Sabe-se, entretanto, que Athena começa por ser pensada no final dos anos 10 como um periódico destinado a projectar apenas um dos aspectos do universo heteronímico, o Neo-Paganismo. Assim, chega a ser prevista com o subtítulo Cadernos de Cultura Superior, com um sumário que inclui apenas António Mora, Alberto Caeiro, Fernando Pessoa e Ricardo Reis (Pessoa por Conhecer, p. 385), e, do mesmo modo, com o subtítulo de Cadernos de Reconstrução Pagã e direcção de António Mora, entra na programação da editora Cosmópolis, cerca de 1919 (Livro do Desassossego, p. 49). De notar ainda que, quando a revista se concretiza em 1924, existe um plano de edição, conexo com ela, de uma série de cinquenta pequenas antologias de autores portugueses, desde Bocage a Ângelo de Lima, e ainda clássicos como Horácio ou Omar Khayyam, e modernos como Edgar Poe ou Mallarmé (E3 48-12).

Fernando Cabral Martins

 

BIBL.:  Pessoa por Conhecer, vol. II, ed. Teresa Rita Lopes, Lisboa, Estampa, 1990; Fernando Pessoa, Livro do Desassossego, vol. I, ed. Teresa Sobral Cunha, Lisboa, Presença, 1990.