Encontram-se, no Espólio de Fernando Pessoa, numerosos esquemas relacionados com as diferentes vertentes da sua obra: obra poética em português e em inglês, a heteronímia, os contos, os ensaios, os projectos de edição, as revistas, as empresas a criar, os projectos de divulgação da cultura portuguesa no estrangeiro e da cultura estrangeira em Portugal e a actividade comercial. Muitos esquemas consistem em listas de títulos, frequentemente encimados pelo título geral do projecto em que se integram. Noutros, é feito o resumo de um conto ou novela e é delineada a sua organização por capítulos. Pessoa não abandonava os seus projectos e continuava a repensá-los e a reorganizá-los ao longo do tempo. Por essa razão, as mesmas obras surgem incluídas em esquemas diferentes que se calcula corresponderem a diferentes momentos do tempo, mas que nem sempre é possível organizar cronologicamente. Alguns dos títulos não terão possivelmente ido além da fase de projecto, ou é difícil atribuir-lhes o texto correspondente. A maior parte dos esquemas dizem respeito à organização da obra literária, mas existem numerosos outros que dizem respeito aos projectos de edição e às actividades comerciais. Pessoa planeou detalhadamente as actividades da Empresa Íbis e da Olisipo, nos seus diferentes ramos – editoriais e comerciais. A obra ensaística, sobre religiões, política, sociologia e filosofia foi igualmente objecto de numerosos esquemas. A planificação da obra literária encontra-se ainda mais representada. A heteronímia, sob a forma do romance-drama-em-gente, foi pensada da seguinte forma: O Regresso dos Deuses – I. Poemas Completos de Alberto Caeiro (1889-1915). 1. Nota dos Editores. 2. Prefácio do Dr. Ricardo Reis. 3. Poemas Completos de Alberto Caeiro: I. O Guardador de Rebanhos. II. O Pastor Amoroso. III. Poemas Inconjuntos. 4. Natividade de Alberto Caeiro, por Fernando Pessoa. 5. Notas para recordação do meu mestre Caeiro, por Álvaro de Campos. O Regresso dos Deuses – II. Ricardo Reis, Odes, LIV. I-III. O Regresso dos Deuses – III. Acessórios, poemas de Álvaro de Campos (Teresa Rita Lopes, Pessoa por Conhecer II, p. 390). Para a obra do semi-heterónimo Bernardo Soares pensou Pessoa, num dos esquemas, a seguinte organização: Livro do Desassossego/ 1. Na Floresta do Alheamento. 2. Viagem nunca feita. 3. Intervalo doloroso, 4. Epílogo na Sombra. 5. Nossa Senhora do Silêncio. 6. Chuva d’Oiro (Bailado. O Último Cisne. Hora Trémula). 7. Litania da Desesperança. 8. Ética do Silêncio. 9. Idílio Mágico. 10. Peristilo. 11. Apoteose do Absurdo. 12. Paisagem de Chuva. 13. Glorificação das Estéreis. 14. As Três Graças (A Coroada de Rosas, A Coroada de Mirtos, A Coroada de Espinhos). A ficção em prosa foi, a dado momento, organizada de acordo com vários conjuntos: Quaresma, Decifrador a agrupar as novelas policiárias; Antíteses com «O Banqueiro Anarquista», «Primeiro Antídoto», «Segundo Antídoto», «Perspectiva Psiquiátrica» e «Alegações Finais»; Hipóteses, com «Manuscrito de um Criticista», «Uma Tarde Clerical», «Filosofia da Gula», «Na Casa de Saúde de Cascais» e «Clavis Áurea»; Spectros, com «A Perda do Hiate ‘Nada’», «Jacob Dermot», «O Desaparecimento do Prof. Serzedas», «O Peregrino» e «O Crime do Dr. Cerdeira»; por fim «Na Farmácia do Evaristo», com o objectivo de servir de introdução a toda a Sociologia. Na prosa, vários esquemas organizam os contos em Contos Intelectuais ou Filosóficos, Tales of a Madman e Contos de um Doido, de Vicente Guedes, Visões e Cartas do Sr. Pantaleão. Existem esquemas a organizarem, para publicação provavelmente, as novelas de Quaresma, Decifrador e as Tales of a Reasoner, do Ex-Sargeant Byng. Os esquemas em que as obras de poesia e de prosa se agrupam sofrem alterações que acompanham o evoluir da obra de Pessoa. Pela quantidade e pelo processo de reformulação constante, a secção do Espólio que contém os esquemas (E3 – envelopes 48) oferece uma ampla visão dos projectos que Fernando Pessoa desenvolveu ao longo da sua vida e do modo como encarava a sua obra.

 

 

Espólio de Fernando Pessoa na Biblioteca Nacional – E3

Teresa Rita Lopes, Pessoa por Conhecer, Textos para um Novo Mapa, II,

Editorial Estampa, Lisboa, 1990.

 

 

Ana Maria Freitas