1867 – 1936)

Escritor italiano e Prémio Nobel da Literatura em 1934, cuja produção abrange variados géneros literários (conto, novela, romance, poesia, ensaio), destacou-se no teatro como dramaturgo, empresário e encenador. A sua obra teatral pode considerar-se um dos primeiros exemplos modernos de uma estética teatral não aristotélica. Os seus textos instauram um teatro de cisões e reflectem a crise do homem contemporâneo. Pirandello desenvolve uma dramaturgia que propõe um novo conceito de personagem, na medida em que descrê da unidade do ser e aponta para uma desintegração da personalidade conducente a uma incapacidade de comunicação e ao consequente desconhecimento de si mesmo. A par desta filosofia (no «Prefácio» a Seis Personagens... afirma-se um escritor de natureza filosófica), desenvolve nessa obra, a mais marcante, um discurso metateatral encenando o jogo do teatro no teatro, em que também há uma concepção nova de efabulação dramática. Pretende envolver o público «numa espécie de psicodrama» numa busca incessante da verdade que sabe não existir fora da subjectividade das personagens.

Em Portugal, foi dado a conhecer pelo repertório da Companhia Dramática Italiana do Teatro Argentina, de Roma, que apresentou em Dezembro de 1923 a peça Sei Personaggi in cerca d’Autore (Seis Personagens em Busca de Autor) no Teatro Politeama, de Lisboa. Afirmava-se no programa: «Esta comedia não se devide em actos nem tem scenario algum. A representação é interrompida duas vezes. A primeira vez sem descer o pano e a segunda porque o maquinista por distracção o faz descer.» Em Junho de 1925 a companhia de Mimì Aguglia apresentou, em espanhol, Ciascuno a suo modo, no Teatro de São Carlos. Nos finais desse mês, António Ferro apresenta no seu Teatro Novo a peça Para cada um sua verdade, tradução de Così è (se vi pare).

Em Setembro de 1931, Pirandello assiste em Lisboa, e um pouco por todo o país, com um estatuto de convidado de honra, ao V Congresso Internacional da Crítica, que reúne cerca de setenta representantes das diversas associações mundiais de críticos, organizado por António Ferro, o Presidente da Associação Portuguesa da Crítica. Durante o Congresso, a 21 de Setembro, dá-se a estreia mundial de uma peça sua, escrita, dois ou três anos antes, Sonho, mas talvez não... (Un sogno, ma forse no), em tradução de Caetano de Abreu Beirão, num programa duplo com Dinis e Isabel, de António Patrício, no Teatro Nacional, produzido pela Companhia Rey Colaço-Robles Monteiro. No intervalo, é agraciado, pelo Governo, com a Ordem de Santiago da Espada.

É sobretudo a partir da sua presença em Portugal que a influência de Pirandello se fará sentir, a diversos níveis, na criação teatral portuguesa. Eduardo Scarlatti, membro da delegação portuguesa ao Congresso, considerava-o «um grande reformador do Teatro», título do capítulo que lhe dedicou nas suas memórias (Em Casa do Diabo, 4º vol., Lisboa, Livraria Luso-Espanhola, 1946, p. 180). Aliás, o mesmo crítico já em 1927 estudara a estética de Pirandello, no livro Ideias de Outros. Neese mesmo ano, José Régio publicara na Presença, nº 7, o ensaio sobre «Uma peça de Pirandello (Seis personaggi in cerca d’auctore)».

Todavia, é na geração seguinte que o «pirandelismo» mais se fará sentir no teatro, sobretudo em temas como a força da loucura, o absurdo, uma lógica sem regra, o humor e a racionalização que conduz a um desdobramento do eu. Refira-se, a título de exemplo, os dramaturgos João Pedro de Andrade (Continuação da comédia, 1931) e António Pedro (Comédie en un acte, c. 1935). Poderão, ainda, encontrar-se, eventualmente, traços pirandelianos nalgumas obras de Almada Negreiros, Alfredo Cortez, Joaquim Paço d’Arcos, Fernando Amado, José Régio, Avelino Cunhal e Jaime Salazar Sampaio.

A presença de Pirandello em Portugal encontra-se estudada por Maria José de Lencastre em Con un sogno nel bagaglio. Un viaggio di Pirandello in Portogallo (Palermo, Sllerio editore, 2006).

 

José Camões