A Vida Portuguesa foi uma das publicações periódicas propriedade da Renascença Portuguesa; surgiu como “quinzenário de inquérito à vida portuguesa” a 31 de Outubro de 1912 e desapareceu em Novembro de 1915, com 39 números publicados; a partir do número 18 (2.10.1913) passou a mensário e tomou o subtítulo de “boletim de inquérito à vida nacional”, e a partir do número 21 (15.1.1914) o de “boletim da Renascença Portuguesa”. Teve duas séries, a primeira até ao número 21, a segunda do número 22 (10.2.1914) até final. Foi seu secretário e administrador Álvaro Pinto e seu director Jaime Cortesão, que assinou no primeiro número o editorial de apresentação, dizendo que o quinzenário nascia como “inquérito à vida nacional sob o quádruplo aspecto do problema religioso, pedagógico, económico e social, tentando resolvê-lo, em harmonia com o espírito moderno”. Há alusão simpática de Fernando Pessoa ao boletim em carta a Álvaro Pinto, com data de 29 de Julho de 1913, prometendo empenhadamente colaboração, o que nunca se chegou a verificar.

Foi A Vida Portuguesa que, por iniciativa do seu director, deu publicidade no número 22 aos dois manifestos da Renascença Portuguesa, o primeiro, “Ao Povo Português. A Renascença Lusitana”, assinado por Teixeira de Pascoaes, e o segundo, “Ao Povo. A Renascença Portuguesa”, da autoria de Raul Proença. Os manifestos, elaborados ainda no ano de 1911, no seio das duas reuniões preparatórias do lançamento da sociedade, nunca chegaram ao público até ao ano de 1914, visto que nenhum deles conseguiu fazer o pleno dos sócios fundadores, o primeiro por desacordo de Sérgio e Proença, o segundo pelo não consentimento de Leonardo, Pascoaes, Cortesão e Álvaro Pinto. Os textos documentam as visões divergentes que estiveram na origem da fundação da Renascença Portuguesa, e como documentos foram depois publicados em 1914.

Entre os muito artigos publicados pelo boletim, assinale-se o de Cortesão, “O Centenário de 1915” (n.º 2, 15.11.1912), porventura a primeira afirmação historiográfica  do autor, que mereceu de imediato um paternal ataque da parte de António Sérgio, “Variações do Amigo Banana, Amador de Estudos Históricos, sobre Inquisição e Humanismo, Divulgadas para Entretém dos Ociosos por um seu Familiar Indiscreto, e também Amador dos Ditos Estudos” (n.º 4, 15.12.1912). O texto deu origem a uma demorada e viva polémica entre interpelante e interpelado, que teve o seu termo com “O Parasitismo Peninsular. Carta a Jaime Cortesão” (n.º 20, 1.12.1913). Esta controvérsia de ideias, para além de aferir a visão utilitarista de Sérgio e o cosmopolitismo genuíno e situado de Cortesão, serviu para preparar o terreno dentro da Renascença Portuguesa para a rude e surda polémica que terá lugar desta vez nas páginas da revista A Águia entre o racionalismo pragmático de Sérgio e o saudosismo poético de Pascoaes.

Por isso, num dos textos mais ásperos desta primeira contenda pública de ideias dentro da Renascença Portuguesa, “Golpes de Malho em Ferro Frio” (n.º 6, 2.8.1912), dedicado “aos portugueses de 16 anos que não ambicionam ser poetas líricos”, Sérgio ditará, não distinguindo entre Cortesão e Pascoaes: “Só alcançaremos um viver decente quando atirarmos completamente ao diabo o Historismo e o Saudosismo.” Estava encontrado o tom para a volta contra Pascoaes.

 

Bib: SAMUEL, Paulo, A Renascença Portuguesa. Um Perfil Documental, Porto, Fundação Engenheiro António de Almeida, 1990, pp. 399.

António Cândido Franco