Folhas de Artes - capa

 

 Esta revista é composta, literalmente, de 'folhas de arte', soltas e agrupadas numa pasta de pano com o nome da publicação. Cada poema é autógrafo, escrito e assinado, com daguerreótipo do autor. Era dirigida por Augusto de Santa-Rita, sendo uma das melhores revistas modernistas, uma verdadeira obra de arte, e bastante esquemática. O tema do primeiro número será a poesia contemporânea, onde Pessoa colabora com "Canção" (p.17), e o segundo será sobre o lied nacional e vem com um 'aviso' editorial: "O presente número [...] destina-se a ser incluído na capa do número anterior [...], os quais, conjuntamente com o terceiro - Desenho e Pintura -, constituirão o TOMO PRIMEIRO." [sic]

Esta revista apresenta a particularidade de ter colaboração exclusivamente literária, normalmente de inéditos, à excepção da já referida fotografia.  

A lista de colaboradores é extremamente reconhecível para o leitor do período, salientam-se, à cabeça do primeiro número, três mulheres poetas com vínculos pessoais e familiares aos mais conhecidos modernistas: Branca Gonta Colaço (filha do político e escritor português Tomás Ribeiro e casada com Jorge Rey Colaço, ceramista importante, com quem terá o filho Tomás Ribeiro Colaço, escritor), Fernanda de Castro (mulher do influente António Ferro) e Virgínia Victorino, talvez a poetisa mais conhecida deste período.

Por outro lado, de forma a ratificar a revista no exíguo espaço literário, são também incluídos dois mortos ilustres, vultos importantes para o panteão modernista: Gomes Leal, recentemente desaparecido em 1921, e António Nobre, um precursor cujo foi considerado por Pessoa um dos seu livros de eleição.

No segundo número, como se disse, o tema girará à volta da música, com letras do director da revista e de alguns dos poetas já incluídos no número anterior - Afonso Lopes Vieira, Augusto Gil - em diálogo com as pautas musicais de Claudio Carneyro (filho do pintor e ilustrador nortenho António Carneiro), Luís de Freitas Branco e do vanguardista Ruy Coelho, a trindade cimeira da música de então.

 O terceiro número nunca sairá, o que se pode justificar pelos custos avultados de composição e impressão destes cartões de altíssima qualidade, agrupados por uma fita em tecido. Um paradigma do encontro, nas revistas modernistas, entre tradição e modernidade.

 

Ricardo Marques